Tradições na feira da palhaça, tendo algumas feito furor até à década de 1960, outros terminaram mais cedo
- O jogo da vermelhinha - Este jogo dava com frequência origem a cenas de grande discussão e até pancadaria, pelo facto dos jogadores se sentirem burlados, pois as regras do jogo eram quase sistematicamente viciadas.
- O “homem da banha da cobra”- Enquanto a mulher vendia o unguento e mostrava aos fregueses como usá-lo, o homem ia lançando os pregões do maravilhoso produto que ainda hoje cura bicos de papagaio, dores de costas, irritações de pele, enfim... todos os males que, por desventura, possam apoquentar o ser humano. O insólito de tudo isto estava no facto do homem ter, durante todo o tempo, uma enorme jibóia enroscada no seu corpo que o ia percorrendo dos pés à cabeça. Esta, que teria um diâmetro muito próximo dos 15 centímetros, sendo deveras comprida, era exibida como um dos exemplares donde se poderia extrair a banha, que era vendida em caixinhas de papel.
Escusado será dizer que à volta deste charlatão se acotovelava constantemente grande multidão de curiosos.
- Carteiristas - Quem nunca faltava nem falta em nenhum recinto de feiras ou de festas são os carteiristas; esses porém, são dos poucos personagens que ainda não passaram à história.
- Borda d’água, Seringador - Aqui tínhamos previsão meteorológica a longo prazo, apregoada pelo vendedor de pequenos opúsculos que ainda hoje poderemos encontrar.
- Ceguinhos - Outra das grandes atracções eram, sem dúvida, os cantadores; quase sempre pobres ceguinhos que de alforge e viola às costas, demandavam feiras e outros locais onde se aglomerasse muita gente.
Traziam pregados ao casaco e ao alforge, com alfinetes ou molas da roupa, os folhetos que um moço “de cego” vendia pelos assistentes enquanto o cego cantava ou apregoava a tragédia da qual era arauto. Naqueles, em letra impressa, eram relatados em verso melodramas, fortes paixões que levavam ao suicídio, crimes passiona is, mortes súbitas e outras desgraças.
Estas cantigas, de cunho melodramático, contavam geralmente casos verídicos ocorridos na região, um tanto fantasiados, cantadas pelos ceguinhos em estilo de fado. Dado o seu sensacionalismo tinham muita audiência, formando-se grandes “adjuntos” ao redor do cantado. Este espectáculo quase podia comparar-se ao jornal do crime ou a casos de polícia. Porém, este modo de comunicação tinha vantagens em relação ao actual: as notícias corriam campos e aldeias e andavam na boca de toda a gente por muito tempo. Hoje, volvidos mais de 60 anos, tivemos o gosto de ouvir uma senhora com 83 cantar-nos os seguintes versos, que relembra da sua juventude e relatam um, de tantos desses dramas.
Ó minha mãe venha ver
O Mário no chão estendido
Por causa da Corininha
Deu dois tiros no ouvido.
Corina estás à janela
Corina eu também estou
Por causa de ti Corina
É que o Mário se matou.
E a mãe do Mário endoidece
Da sala para a cozinha
Matou-se seu querido Mário
Por causa da Corininha.
Corina o Mário morreu
E tu não o foste ver
As coroas que lhe mandaste
Voltaste-as “àrreceber”.
Ó Corina tira o luto
Que o luto não te está bem
Tu hás-de vestir de luto
Em morrendo a tua mãe.